sábado, 3 de março de 2012

Telefonemas de uma avó viajante


Às vezes eu chego na casa da minha mãe e digo: - Mãe, minha avó me ligou hoje. Ela me olha, franze a testa e depois faz de conta que eu não disse nada. Minha mãe é muito católica, evangélica e simpateira, por isso ela não gosta que eu brinque com essas coisas do além.

Mas na minha concepção, minha avó, que faleceu em 2006, não está no “além”...aliás esse negócio de além é muito assustador, é quase como se minha avó fosse Dostoiévski e tivesse que ser isolada da sociedade ditatorial russa.

Com certeza minha avó era tão subversiva como Dotoinho, que eu passei a chamar assim depois que ganhei “Recordações da Casa dos Mortos”, que leio todos os dias antes de dormir. Sentiu a intimidade?

Mas minha avó não era russa, era índia bugra e essas pessoas são notórias por serem bravas e obstinadas a não ficarem presas como cavalos, por isso eram pegas no laço, literalmente.

O único laço que prendeu minha avó foi uma maternidade bonita que ela exerceu por todos os seus anos de vida, já que dava ordens para irmãos, tios e primos.

A maça dela não caiu longe da árvore, e eu também adoro mandar nas pessoas e fugir de casamentos.

Mas não dá para mandar em todos sempre, nem para estar 100% certa (se bem que eu queria), então quando eu piso na bola, vovó me liga entre meia noite e seis da manhã para puxar minha orelha.

Tem que haver um lado positivo quando cometemos erros; Dotô escreveu os melhores livros do mundo, e eu que não sou perfeita, além de aprender algo, converso com minha voínha quase todas as noites.

-A benção, vovó.
-Jesus te faça feliz, minha filha!




*simpateira: pessoas que acreditam no Deus do arroz no copo de água que emagrece.

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